A RESPONSABILIDADE CIVIL COMPARTILHADA ENTRE OS PAIS E A ESCOLA POR BULLYING
- dranathaliemilady
- 20 de nov. de 2024
- 7 min de leitura
A prática de bullying é um problema presente na maioria das instituições de ensino ao redor do mundo, e por isso grandes discussões sobre o tema vêm sendo tomadas pelas legislações e órgãos responsáveis. Outrossim, um dos maiores debates sobre o tema diz respeito à responsabilidade compartilhada entre os pais de crianças que praticam o bullying e as escolas onde essas práticas acontecem de forma recorrente.
Neste artigo, vamos explorar a responsabilidade compartilhada entre pais e escola no combate a esse fenômeno, analisando seus papéis e as medidas que podem ser tomadas para prevenir e combater o bullying.

1 - A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PAIS PELO BULLYING
Os pais são protagonistas na formação de caráter e na construção dos valores e comportamentos de seus filhos, pois são os primeiros educadores e modelos a serem seguidos.
Algumas das responsabilidades dos pais no combate ao bullying incluem ensinar aos filhos valores como respeito, empatia, solidariedade e tolerância, o que será crucial para prevenir comportamentos preconceituoso e agressivos, além de evitar uma atitude de superioridade, onde a criança não consegue respeitar a individualidade e a personalidade dos demais indivíduos ao seu redor.
Outro ponto a ser reforçado pelos pais é o das consequências que o bullying pode trazer às suas vítimas. Ou seja, usando o diálogo como principal ferramenta na relação com os filhos, os pais podem expor o tipo de sofrimento que tais atitudes podem ocasionar, incentivando em seus filhos a capacidade de ser empático.
Ademais, a responsabilidade civil dos pais surge como um dos pontos cruciais na discussão sobre o combate ao bullying. Afinal, os genitores são os principais responsáveis pela educação dos filhos e, em muitos casos, podem ter um papel fundamental na prevenção e na resolução desse tipo de conflito.
1.1 - ASPECTOS LEGAIS DA RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PAIS E DAS ESCOLAS POR BULLYING
No Brasil, o Código Civil estabelece em seus arts. 932, I e 933 a responsabilidade civil dos pais pelos atos ilícitos praticados pelos filhos menores, mesmo que não exista culpa de sua parte (dos pais). Senão, vejamos:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
[...]
Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
Essa responsabilidade se fundamenta na ideia de que os pais têm o dever de educar e supervisionar seus filhos, e que, ao falharem nessa obrigação, respondem pelos danos causados por eles.
Nesse sentido, alguns pontos devem ser esclarecidos, tais como os seguintes conceitos:
A) RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA: Nos casos em que a legislação brasileira trata da responsabilidade objetiva de algum indivíduo, essa responsabilidade será observada independente da culpa pelo fato, ou seja, ainda que o indivíduo não tenha contribuído diretamente para o fato através de imperícia, imprudência ou negligência, este terá o dever de reparação.
B) EXCEÇÕES: A responsabilidade civil objetiva poderá ser afastada nos casos de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro ou caso fortuito e força maior. Nos casos dos pais em específico, sua responsabilidade pelos atos dos filhos pode ser afastada se comprovado que estes fizeram tudo o possível para evitar o fato ou dano, ou, ainda, quando ficar comprovado o dolo total do filho pelo evento (intenção de causar o dano).
C) RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA: A responsabilidade solidária é aquela prevista apenas pela lei, e diz respeito aos eventos pelos quais duas pessoas ou mais possuem o mesmo dever de reparação. Dessa forma, em algumas situações os pais serão responsáveis pelos atos de seus filhos junto com a escola ou instituição onde ocorreu o dano.
Ainda sobre o tema, podemos trazer a baila algumas decisões tomadas por diversos Tribunais do país em que a responsabilidade dos pais e da instituição de ensino foi comprovada diante da prática de bullying, com a devida condenação ao pagamento de indenização pelos danos morais. É o que se vê a seguir:
APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AGRESSÃO PSÍQUICA A MENOR. BULLYING EM ESTABELECIMENTO ESCOLAR. COMPROVAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E SOLIDÁRIA DOS PAIS E COLÉGIO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
- Observado a teoria da asserção, em princípio a legitimidade das partes deve ser definida de acordo com a narração fática contida na inicial. Apontada a responsabilidade da parte requerida na contratação de financiamento, no âmbito do qual houve falha na prestação de serviço, a sua legitimidade passiva deve ser reconhecida.
- Nos termos da lei 13.185/2015, a instituição de ensino é responsável pelo dever de guarda e deve proporcionar um ambiente saudável aos seus alunos, perpetrando medidas de conscientização e combate ao bullying.
- A relação jurídica existente entre a autora e a instituição de ensino é de natureza consumerista, pelo que a responsabilidade do requerido pelos danos oriundos de defeitos na prestação de seus serviços é objetiva, nos moldes do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.
- Por força do art. 932, I e 933 do Código Civil, os pais respondem objetivamente por atos ilícitos que venham a ser praticados pelos filhos menores de 18 anos. - Os transtornos, frustrações e abalos psicológicos oriundos da prática de bullying nas dependências da escola ultrapassam a esfera do mero aborrecimento e adentram ao campo do dano moral. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.22.029195-9/001, Relator(a): Des.(a) Luiz Carlos Gomes da Mata , 13ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 01/12/2022, publicação da súmula em 02/12/2022)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE RÉ. MANUTENÇÃO DO DECISUM. RELAÇÃO DE CONSUMO. ART. 14, §3º, CDC. RISCO DO EMPREENDIMENTO. BULLYING. VIOLÊNCIA NO AMBIENTE ESCOLAR QUE RESTOU INCONTROVERSA. DANOS SOFRIDOS PELOS APELADOS. NEXO DE CAUSALIDADE COMPROVADO. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS PELA APELANTE. INTELIGÊNCIA DO ART. 373, II, CPC. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. SÚMULA 343 TJRJ. PARECER DA PROCURADORIA DE JUSTIÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS DE ACORDO COM ART. 85, §2º, CPC. DESPROVIMENTO DO RECURSO.
(0008137-98.2019.8.19.0066 - APELAÇÃO. Des(a). MAURO PEREIRA MARTINS - Julgamento: 06/08/2024 - VIGESIMA PRIMEIRA CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 19ª CÂMARA CÍVEL))
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO DE DANOS MORAIS. BULLYING EM AMBIENTE ESCOLAR. ARGUIÇÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA, POR SUPOSTA FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA E POR CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. QUESTÕES PROCESSUAIS QUE SE CONFUNDEM COM O MÉRITO. EFEITOS DA REVELIA. AFASTAMENTO QUE SOMENTE SE DÁ QUANTO A CIRCUNSTÂNCIAS COMUNS. JUNTADA DE DOCUMENTOS EM SEDE RECURSAL. NECESSIDADE DE QUE SE REFIRAM A FATOS NOVOS. INTIMIDAÇÃO SISTÊMICA. COMPROVAÇÃO DAS CHACOTAS E BRINCADEIRAS LEVIANAS. PRESENÇA FÍSICA DOS PAIS NO MOMENTO DOS FATOS. DESNECESSIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. COMPENSAÇÃO MORAL. FIXAÇÃO EM MONTANTE ADEQUADO. PRELIMINARES REJEITADAS. NO MÉRITO, DESPROVIDO O APELO.
1. Tratando-se de mera irresignação com as conclusões a que chegou a sentença, e não de fundamentação genérica ou dissociada dos fatos alegados na petição inicial ou na contestação, é de se rejeitar a arguição de nulidade do decisum, por deficiência em sua fundamentação.
2. Tampouco há que se falar em cerceamento de defesa se a parte que a suscita não foi impedida de produzir quaisquer provas, ou de levar ao conhecimento da autoridade judicial qualquer argumentação apta ao seu convencimento.
2.1. Na espécie, é de se notar, ainda, que a parte que invocou o cerceamento de defesa: a) foi revel, tendo ingressado no feito apenas antes da Audiência de Instrução e Julgamento; b) não juntou qualquer documento; e c) desistiu da produção da prova testemunhal.
3. O afastamento dos efeitos da revelia, previsto no inciso I, do art. 345, do CPC, somente tem aplicação quanto à impugnação de fatos comuns, ou seja, apenas no tocante à identidade de matéria defensiva partilhada.
3.1. No caso de a responsabilidade de cada réu ser diversa, tratando-se da imputação de fatos igualmente distintos, inclusive quanto à conduta de cada um, inviável que se afaste os efeitos da revelia pelo simples fato de um deles ter contestado. Precedentes do STJ e deste TJDFT.
4. Embora seja admitida a juntada de documentos novos, em qualquer fase processual, inclusive recursal (art. 435, do CPC), caberá à parte que juntou o documento comprovar o motivo que a impediu de juntá-lo no momento adequado.
4.1. Não se tratando de documento novo, ou que se refira a fatos novos, e considerando que a revelia, por si só, não impediu o exercício do ônus probatório, inviável que se valore as fotografias carreadas aos autos, mormente quando elas não têm o condão de influir no julgamento do mérito.
5. No mérito, sobeja patente a ocorrência das ofensas e chacotas, no ambiente escolar, de forma reiterada e continuada. Assim, sobeja configurada a figura da intimidação sistêmica (bullying), prevista na Lei 13.185, de 6 de novembro de 2015.
5.1. A expressão "em sua companhia", prevista no art. 932, I, do CC, não exige a proximidade física dos pais no momento em que o filho venha a causar o dano.
5.2. A responsabilidade dos pais, para a reparação civil dos danos causados pelos filhos, prescinde de culpa, a teor do que dispõe o art. 933 do CC.
6. A quantificação dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e de proporcionalidade, levando-se em conta, al&
(Acórdão 1125053, 20150410064400APC, Relator(a): ALFEU MACHADO, 6ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 19/09/2018, publicado no DJe: 25/09/2018.)
Assim, podemos ter a certeza que, diante da prática de bullying em escolas, os pais serão responsáveis, assim como a instituição de ensino, por reparar os danos físicos e/ou psicológicos causados por seus filhos e alunos, exceto nos casos em que fique comprovado que os responsáveis civis tomaram todas as providências necessárias para evitar o fato.
2 - COMO PROCESSAR OS PAIS PELA PRÁTICA DE BULLYING
A possibilidade de processar os pais por bullying é um tema que exige uma análise cuidadosa e individualizada, e é importante ressaltar que, a decisão de ingressar com uma ação judicial gera uma série de consequências e deve ser tomada com o auxílio de um advogado.
Alguns dos fatores que devem ser levados em conta no momento de acionar a justiça, são a gravidade do bullying ou do dano, a idade do agressor, a conduta dos pais e a devida auferição da responsabilidade escolar.
Além disso, os pais podem se deparar com alggumas dificuldades, como a colheita de provas dos atos e da extensão dos danos causados, além de ser um processo que pode vir a trazer uma revitimização do agredido, a depender da forma como os profissionais responsáveis lidem com o processo.
Porém, é importante que as ações sejam movidas para que cada vez mais os pais e as escolas busquem manter uma vivência saudável entre as crianças, educando-as acerca do respeito devido para com todos.
Por fim, a possibilidade de processar os pais por bullying é uma medida extrema e deve ser analisada caso a caso. É fundamental buscar orientação jurídica para avaliar a viabilidade da ação e as chances de sucesso.
Recomenda-se que a vítima e sua família procurem apoio psicológico e busquem soluções que priorizem a resolução do conflito e a prevenção de novos casos de bullying.
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